Esclarecimentos sobre testes e debate aprofundado sobre tratamento na fase 1 de Covid-19 foram os destaques do VII Fórum da SMCC

10 jul, 2020 | Notícias


A 7ª edição do Fórum “Situação Atual Covid-19 em Campinas” promovido pela Sociedade de Medicina e Cirurgia de Campinas (SMCC) nesta quinta-feira (09/07) focou nos temas Testagem e Tratamento na Fase 1 (Leve) do Covid-19.  

Um assunto desafiador e motivo de grande reflexão da classe médica e cientistas principalmente quando se questionam quanto as reais evidências científicas sobre Covid-19. O debate foi aprofundado e em alto nível, com bastante respeito entre os profissionais apesar das divergências. Foi ponderado que dentro da prática médica o momento exige uso do bom senso e que nada deve substituir a autonomia do médico e a relação verdadeira com seu paciente.

O conteúdo completo do VII Fórum SMCC pode ser assistido pelos Canais da SMCC:

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Situação dos Hospitais

O Fórum começou com a tradicional atualização sobre taxa de ocupação e acompanhamento dos casos pelos principais representantes de unidades hospitalares da cidade. A situação dos leitos manteve-se aparentemente estabilizada ao longo da última semana. Houve sucesso no manejo da infecção entre profissionais de saúde pelas instituições controlando melhor o contágio entre as equipes de saúde. 

Novamente, praticamente todos os serviços relataram aumento considerável na demanda de atendimentos nos prontos-socorros da cidade.

Em relação às ações propostas no fórum anterior (02/07) O Secretário de Saúde de Campinas, Dr. Carmino de Sousa disse que a EMDEC já foi envolvida nas discussões. O médico afirmou ainda que pretende reunir com hospitais para discutir a retomada das cirurgias eletivas, tão logo o município saia da classificação vermelha definida pelo governo estadual.


Testagem

O Coordenador do Departamento de Patologia Clínica da SMCC, Dr. César Alex de Oliveira Galoro foi convidado para esclarecer dúvidas a respeitos dos testes diagnósticos.

Dr. Alex destacou o fato de ainda estarmos no que na área médica se chama de “primeira geração” de testes para Covid-19 e que há ainda uma quantidade de falsos negativos e positivos ainda importante.

“Eu acho que a gente tem que considerar qual é a fase da história natural da doença e qual é a informação que você quer tirar fazendo aquele teste (…) O PCR até pela metodologia tem um desempenho melhor. Tem estudos falando de até 15% de falso negativo dependendo do estágio da doença. Um negativo não significa que a pessoa não tem a doença. Vai depender da carga viral e da fase que está sendo feita. Mas é um teste que te dá mais informação”.

E concluiu dizendo: “As sorologias elas vão ser usadas para detectar os anticorpos que variam bastante para aparecer. Então, quinze dias depois do início dos sintomas você pode ter de 10 a 15% dos pacientes que podem ainda não ter o anticorpo. A sensibilidade seria somente a partir deste momento. Se a pessoa tem o vírus não significa necessariamente que ela pode estar transmitindo. Tem gente que fica de 14 até 20 dias depois com PCR positivo por causa de resquícios das partículas virais”.

Sobre um ponto crítico levantado em Fóruns anteriores, o tempo para entrega de resultados dos exames de Covid-19, Dr. Alex mencionou o que considera importante sobre a atividade dos laboratórios em Campinas e a necessidade de agilizar os resultados dos testes. Segundo ele, todos os laboratórios da cidade terceirizam os exames e por isso dificilmente será possível diminuir o prazo de entregas do PCR, por exemplo. Com o surgimento da pandemia, as empresas não tiveram tempo hábil para aumentar capacidade produtiva, falta insumos e o exame para Covid-19 exige protocolos demorados de execução.

“Outra coisa é que as amostras de PCR nunca foram projetadas para grandes demandas. A gente tem os principais testes para demanda maior na biologia molecular que são as cargas virais das hepatites e HIV, mas, mesmo assim, não foram projetados como exames de bioquímica, sorologia ou hormônios que têm grande capacidade de processamento”.

Por fim, Dr. Alex afirmou que a entidade (SMCC), através do Departamento de Patologia Clínica, estará a frente de uma mobilização para atentar para a qualidade dos testes e buscar alternativas de agilizar o resultado junto a grandes laboratórios da cidade.


Tratamento Fase 1: Debate em Alto Nível

Para este momento do Fórum, foram convidados diversos especialistas, todos indicados e referendados pelos médicos do núcleo montado desde o início da pandemia, que reúne representantes e dirigentes dos principais hospitais, operadoras de saúde, governo, instituições de saúde e todas as faculdades de Medicina da nossa cidade.

Houve divergência sobre tratamentos e em quais momentos de desenvolvimento da doença devem ser aplicados, principalmente na fase inicial. Porém, com argumentos de alto nível os participantes levantaram questões interessantes para a reflexão da área médica.

O Coordenador do Departamento de Comunicação e Marketing da SMCC, Dr. Marcelo Amade Camargo, que moderou o Fórum, fez questão de registrar a importância da comunicação do médico com seu paciente e o registro do atendimento logo no início e ao final da discussão.

“Em relação ao tratamento deve-se garantir a autonomia do médico. Isto está acima de qualquer discussão, até porque a responsabilidade recai sobre ele, seja quando prescreve ou quando não prescreve qualquer tratamento. O médico deve sempre falar a verdade para o paciente esclarecendo suas convicções e registrar tudo em prontuário”.

Nota da redação: seria uma grande pretensão levantarmos todos os pontos discutidos no Fórum e transmiti-los neste texto. Para tanto, recomendamos assistir ao vídeo ou ouvir o podcast na íntegra para que cada colega possa tirar suas próprias conclusões. Nos restringimos aqui a destacar alguns argumentos relevantes do debate feitos pelos convidados especiais.

Dr. Antônio Jose Pinho Junior, imunologista (São Leopoldo Mandic) abriu a discussão com uma explanação sobre alguns fundamentos imunológicos e foi o principal responsável por fazer o contraponto em relação ao uso de medicamentos (hidroxicloroquina, ivermectina, zinco e outros) na fase precoce. De forma bastante respeitosa e com argumentos de alto nível, discordou sobre a falta de evidências e defendeu seu ponto de vista. “Eu sinto divergir de vocês. Nós temos várias evidências. Pode não ser evidências que querem, mas temos!”, pontuou o médico que explanou dados detalhados de estudos. Dr. Pinho comentou que mesmo o estudo RECOVERY, de Oxford, não publicou dados do braço com uso de outras medicações, o que foi motivo de correspond6encia direcionada aos autores.

Dr. Luis Gustavo Cardoso, infectologista (CCIH HC Unicamp / Centro Médico Campinas) expos seus argumentos e fez uma análise crítica de diversos trabalhos citados e destacou outros com melhor nível de evidência.

A infectologista Dra. Inês Helena de Barros Leal Saraiva (CCIH Hospital Vera Cruz Casa de Saúde) se mostrou preocupada com a abertura de várias frentes de pesquisas e medicações para tentar conter o Covid-19. Para ela corre-se o risco de não praticar uma medicina com base em evidências científicas uma vez que não se concentra esforços em uma só frente de ação. “Se abrem muitas portas, tem dificuldades depois de avaliar todas estas frentes para ver qual vale a pena seguir”.

A médica apenas considerou que na prática médica o que tem se visto é um movimento de assertividade quando se trata do período mais grave dos pacientes. “A gente está vivendo um momento único. Minha impressão pessoal é que as medidas de suporte avançado à vida tem sido a grande arma contra o Covid-19, principalmente em pacientes graves”.

Dr. André Ribas, epidemiologista, (Faculdade São Leopoldo Mandic) lembrou que mesmo com divergências ele aposta na análise de cenário prático que os outros países já revelaram. “O que acontece é que a gente teve um isolamento (no Brasil). Todos os países minimamente sérios mudaram suas rotinas e estão usando máscaras. Então você não está tendo um R0 livre como teve na China. E o que aconteceu na própria China demonstrou que a transmissibilidade era alta porque você tinha uma quantidade suficientemente grande de susceptíveis. O modelo matemático que foi estudado na China foi estudado em uma condição virgem de proteção das pessoas”, lembrou o infectologista fazendo um comparativo com o momento atual em que existem medidas de higiene e proteção.

Dra. Elisa Mendes, infectologista (Hospital Celso Pierro – PUCC) disse que no contexto da unidade onde trabalha tem estudos relacionados com algumas medicações. Seriam ao todo quatro protocolos em andamento na instituição, dois deles estudos de Fase II e dois de Fase III. “No comecinho da pandemia a gente usou por um tempo nos pacientes graves e confirmados e logo depois a própria equipe da UTI encerrou este uso”. A médica alertou que a experiência dela esteve restrita a pacientes já internados. 

Dr. Augusto Vieira Amaral, coordenador do PS do Hospital Madre Theodora, elogiou as considerações dos colegas que o antecederam e relembrou a questão da incerteza sobre a segurança do uso destes medicamentos. Dr. Augusto expos dados muito interessantes sobre o perfil dos pacientes em seu serviço e o desfecho, com a colaboração de mais de 30 profissionais sob sua coordenação, demonstrando grande atenção ao acompanhamento dos casos atendidos em sua unidade.

Dr. Leandro Mendes, também infectologista (CCIH Hospital Irmãos Penteado / Santa Casa de Campinas) acredita que as posturas radicais não ajudam. Não é possível impor um protocolo e, sim deixar para que o médico faça sua reflexão a partir dos conhecimentos e evidências. E lembrou do problema da resistência bacteriana a antibióticos (no caso, a Azitromicina) caso seu uso seja feito de forma desordenada. O impacto pode se dar na seleção de cepas resistentes e até mesmo a seleção de cepas de sorotipos não cobertos por vacinas.

Pela Rede Mario Gatti, o intensivista Dr. Carlos Arca explicou que os protocolos ajudam no controle no que tange a estoque, regulação e medidas necessárias para a gestão dos recursos como as próprias medicações. Contudo, este aspecto serve mais como um norte administrativo do que imposição por conduta médica.

O Coordenador do Departamento de Infectologia da SMCC, Dr. Rodrigo Angerami, ponderou que esta é a fase de boa prática médica uma vez que os estudos ainda não são robustos para dar sustentação para afirmações padrões sobre tratamento. “Por hora nenhuma das sociedades médicas nacionais ou internacionais, nenhum dos governos com exceção acho do Brasil, tem um protocolo ou diretrizes incluindo estas drogas como opções farmacológicas para o tratamento do Covid-19. A gente tem as agências reguladoras incluindo a norte americana e europeia sugerindo a interrupção dos estudos e não recomendam a incorporação destas drogas”, lembrou o médico.

Dr. Rodrigo fez questão de ressaltar a necessidade de respeitar a pluralidade de opiniões e elogiar mais uma vez as iniciativas que incluem até estudos conduzidos fora da comunidade acadêmica na cidade.

Para o Dr. Rogério Jesus Pedro, renomado infectologista, manter os estudos bem elaborados com análises clínicas é a saída para manter a melhor conduta médica neste momento. Dr. Rogério fez uma análise ponderada de diversos pontos tratados pelos debatedores durante a discussão.

O VII Fórum se estendeu mais que os anteriores devido ao grande interesse e nível da discussão entre os palestrantes. Foram centenas de ouvintes acompanhando o evento. Ao final, Dr. Marcelo relembrou o papel da SMCC em proporcionar o espaço para o debate de ideias e auxiliar a condução do problema em nossa região com a colaboração de todas as entidades envolvidas. “Entramos no debate sem uma unanimidade e saímos sem unanimidade. Já sabíamos disso. A ideia não é converter ninguém e sim oferecer a oportunidade aos colegas de terem acesso a argumentos de alto nível para formarem sua própria opinião. Agradecemos imensamente a todos os palestrantes. Voltaremos ao tema (tratamento) com certeza!” afirmou após o encerramento.

O vice-presidente da SMCC, Dr. José Roberto Amade, resumiu o evento destacando as participações dos especialistas das áreas de infectologia, imunologia, epidemiologia e os desdobramentos dos Fóruns online realizados pela entidade. “Devo destacar o alto nível dos debates. Fóruns que agora estão se desdobrando em outros fóruns mais pontuais. Um exemplo é que já promovíamos alguns eventos com a OAB e, em tempos de pandemia, realizamos nesta semana a primeira reunião de uma Força-Tarefa (Saúde e Direito) sobre aspectos trabalhistas na saúde. Esta reunião já está à disposição de todos no canal da SMCC no YouTube e Spotify”, reforçou.

Na próxima semana, o tema sugerido do Fórum SMCC será “Flexibilização com Racionalidade”.

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